Correria https://correria.blogfolha.uol.com.br Mon, 19 Nov 2018 15:21:45 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Mulheres com asas https://correria.blogfolha.uol.com.br/2018/09/10/mulheres-com-asas/ https://correria.blogfolha.uol.com.br/2018/09/10/mulheres-com-asas/#respond Mon, 10 Sep 2018 13:52:51 +0000 https://correria.blogfolha.uol.com.br/files/2018/09/IMG_2338-320x213.jpeg https://correria.blogfolha.uol.com.br/?p=172 Hoje pego carona no voo alheio. Quem escreve é a leitora Ana Luiza Castro. Não há o que reparar ou acrescentar. Linda história que ela compartilhou comigo e eu compartilho aqui:

“Temos uma equipe de corrida, mas somos diferenciadas… e humildes também (risos). Mas, sem falsa modéstia, a turma é muito bacana e virou uma grande família. Somos mais de 150 Mulheres com Asas, sim, a equipe tem esse nome. WomenWithWings, ou WWW, como foi carinhosamente apelidado.

Na nossa família, temos corredoras experientes e até vencedoras de provas, maratonistas que fazem Majors e provas por todo mundo, mas temos muito mais que isso. Temos mulheres que venceram o câncer e na corrida, nos intervalos de tratamento, se equilibravam novamente.

Temos Dona Maria, uma senhora com seus mais de 70 anos (faxineira até hoje) que só completa a sua longa jornada após realizar seus treinos. Temos mãe de família com três filhos e um “especial”, que encontra a paz quando calça seus tênis. Eu poderia ficar muitas horas aqui escrevendo cada história linda que eu escuto toda vez que uma aluna aproxima sua asinha da minha. Tenho o privilégio de escutar, treinar e acolher todas estas mulheres que se dizem muito mais fortes desde que entraram nossa equipe.

Queria humildemente, com as “histórias do WWW” (https://womenwithwings.wordpress.com/), sugerir aos leitores uma corrida mais despretensiosa, sem paces maravilhosos, sem índices a serem conquistados e marcas pessoais a serem batidas (não podemos achar que só isso é importante), apenas humanizar este lindo esporte. E, principalmente, trazer para todos os leitores que a corrida é, SIM, para todos. Sei que você tem um público que leva a sério o esporte (eu sou uma delas, estou indo para Berlim tentar bater meu tempo na Maratona) mas eu acho que há um vasto número de pessoas (a maioria) que quer correr apenas com um simples objetivo: ser feliz.”

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Furacão Kathrine segue forte 50 anos depois https://correria.blogfolha.uol.com.br/2018/08/15/164/ https://correria.blogfolha.uol.com.br/2018/08/15/164/#respond Wed, 15 Aug 2018 15:55:12 +0000 https://correria.blogfolha.uol.com.br/files/2018/08/IMG_6334-320x213.jpg https://correria.blogfolha.uol.com.br/?p=164 A cena correu o mundo. Antes de falar especificamente dela, porém, é recomendável relembrar o contexto. Os Estados Unidos ardiam em brasas nos anos 60. Guerra do Vietnã, luta pelos direitos civis, uma discussão intensa sobre liberdades. Negros querendo ser, simplesmente, gente. Mulheres exigindo as mesmas oportunidades dos homens. Em meio a tudo isso, a maratona de Boston seguia acontecendo normalmente… apenas com homens. A maratona mais tradicional do mundo começou em 1897 e em 1967, na sua 70º edição, seria disputada… apenas por homens.

O regulamento não era específico, não falava sobre o sexo dos atletas. Mas todos entendiam os códigos não escritos. Maratona era coisa de macho. Mulheres não eram capazes de correr 42 quilômetros. Sexo frágil, sexo débil. Os conceitos de então. E se uma mulher tentasse a inscrição ela receberia uma resposta óbvia: lamento, lady, mulheres não são admitidas em Boston.

Isso até uma jovenzinha de 20 anos, que estudava e treinava em Syracuse (no estado de Nova York) se encantar com as histórias de seu treinador de atletismo Arnie Briggs. Kathrine Virginia Switzer encasquetou que queria correr Boston. Não aceitou as ponderações de seu treinador alertando que Boston não aceitaria. E, influenciada também pelos ídolos da literatura que se apresentavam pelas iniciais (J.D. Salinger, T.S. Eliot), se inscreveu “sem gênero” como K.V. Switzer.

Para encurtar a história, Kathrine foi “encontrada” no quilômetro 3 pelo diretor da prova. O valentão Jock Semple desceu do ônibus de jornalistas e tentou retirá-la da prova arrancando o número de peito 261. O namorado de Kathrine deu um encontrão no diretor de prova e eles seguiram na prova. Os jornalistas fotografaram a cena. Katrhrine, mesmo assustada, completou a prova em 4h20min. A foto do empurrão correu o mundo. Uma mulher havia desafiado o sistema. O feito de Kathrine abriu uma discussão sobre direitos femininos no esporte. Boston precisou se render e permitiu a participação de mulheres a partir de 1972.

Ouvi pela primeira vez essa história em 2012, quase por acaso. Não conhecia a palestrante, e fiquei encantado por ela, e por Boston. Decidi que tentaria correr a maratona de Boston. Por casualidade, consegui o índice (é necessário ter corrido uma maratona anterior em tempos específicos para cada faixa etária) para a edição de 2017. Justamente a que comemorava 50 anos de tudo. E a mesma prova que teria uma sorridente senhora de 70 anos largando com o número 261 no peito. Kathrine não só largou como terminou sorrindo em 4h44min.

A história de Boston e a minha história para chegar a Boston viraram livro. “Boston, a mais longa das maratonas” tem 17 capítulos, mas o 5º é o que mais me toca. O “Furacão Kathrine”, de uma certa forma, resume tudo. Pioneirismo, perseverança, emoção, está tudo lá. Tenho poucos ídolos na vida, mas K.V. Switzer é certamente um deles.

Por isso, recebi algo apreensivo o convite para um evento com ela em São Paulo. Sua patrocinadora Adidas reuniu uns poucos para ouvi-la e depois trotar no Parque do Ibirapuera. Presenteá-la com um exemplar e pedir um autógrafo no meu livro era o mínimo a fazer. Mas ela fez mais. Com um sorriso gigante, pediu que eu traduzisse palavras, me abraçou, me fez gaguejar. E, pela primeira vez, me dei conta do seu grande feito.

Achava que a façanha de Kathrine havia sido desafiar o sistema e bagunçar a praia masculina. Não, esse foi só o ponto de partida. Ela teve a “sorte” de ser agredida por um homem e a cena ter sido fotografada por muitos. A história poderia acabar por aí. Só que Kathrine mudou seus próprios planos. Queria ser jornalista, decidiu que seria uma transformadora. Entendeu que a corrida transforma.

Nos 50 anos seguintes, se dedicou a sorrir, abraçar e, eventualmente, fazer os outros gaguejarem. Primeiro, como atleta, venceu a Maratona de Nova York. Após atazanar a organização de Boston para a inclusão de mulheres, atacou em outras frentes. A pressão bateu no Comitê Olímpico Internacional que, a partir de 1976, incluiu a maratona feminina nas Olimpíadas. Kathrine não parou, jamais. Pegou a corrida como instrumento para o empoderamento feminino, criou sua ONG, passou a organizar provas para mulheres, corre o mundo fazendo isso desde então. Não se cansa de contar a sua história. Sabe que, no final, deixa os cérebros alheios piscando. “Rapaz, é possível, se ela conseguiu, também consigo”. E faz tudo sempre sorrindo.

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Cerimônia de maratona https://correria.blogfolha.uol.com.br/2018/05/29/cerimonia-de-maratona/ https://correria.blogfolha.uol.com.br/2018/05/29/cerimonia-de-maratona/#respond Tue, 29 May 2018 13:29:45 +0000 https://correria.blogfolha.uol.com.br/files/2018/05/f68d994b-16d0-44dc-8a24-8a7650b37f82-320x213.jpg http://correria.blogfolha.uol.com.br/?p=160 A turma que frequenta o Quiosque do Russo na Barra da Tijuca talvez estranhe. Na próxima sexta-feira, um povo diferente vai tomar conta do pedaço. Alguns com sotaque arretado do Ceará, mais especificamente da terra de Padim Cícero, Juazeiro do Norte. Outros com acento gauchesco. Apesar das diferenças, todos pertencentes a uma mesma tribo, a dos corredores.

No centro das atenções, Kelma Alcântara, uma personal training de 34 anos, e o administrador Sandro Decker, de 48 anos. Eles se conheceram em 2014 quando o gaúcho foi trabalhar na indústria calçadista de Juazeiro. Corredor, Sandro logo se enturmou na Corcha, os Corredores da Chapada Araripe. Não demorou muito para se engraçar com Kelma, uma corredora forte de trilhas. O namoro podia ser abalado por razões profissionais já que Sandro precisou voltar para a industria calçadista de Novo Hamburgo. A distância, porém, teve o efeito contrário e apressou a decisão: sim, casamento, mas onde fazer a festa?

Foi quando o casal se deu conta de que os melhores amigos estariam todos na Maratona do Rio de Janeiro no próximo fim de semana. A maioria, aliás, para o desafio de correr a meia maratona no sábado e a maratona no domingo. Pronto, pretexto para ampliar o desafio e começar tudo na sexta-feira numa celebração um tanto original… no quiosque do Russo.

O horário do casamento fugirá dos padrões, 11 horas da manhã. Os trajes serão, digamos, livres. Camisa social, camiseta, calça, bermuda, tênis, chinelo, não há regras. Cerca de 40 convidados, todos os padrinhos e madrinhas são maratonistas. Feita a festa, dormir cedo para as provas de sábado e domingo. Kelma e Sandro não devem pegar tão pesado quanto de costume. Ela, já na estreia, mandou um 3h55 na maratona de Porto Alegre. Ele, que já tem 14 maratonas nas costas, cravou 3h25min também em Porto Alegre. Dessa vez, pretendem desacelerar. Ela de véu, ele de gravata, ainda há tempo para decidir o figurino. Certo mesmo serão os sorrisos. Não é sempre que duas almas gêmeas têm a chance de se encontrar e de se divertir na vida.

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A estética do frio https://correria.blogfolha.uol.com.br/2018/05/23/a-estetica-do-frio/ https://correria.blogfolha.uol.com.br/2018/05/23/a-estetica-do-frio/#respond Wed, 23 May 2018 11:33:01 +0000 https://correria.blogfolha.uol.com.br/files/2018/05/IMG_2003-320x213.jpg http://correria.blogfolha.uol.com.br/?p=156 Conversa entre irmãos.

— Resolvi correr hoje. Corri às cinco pra fugir do frio.
— Eu também. Corri às cinco. Mas às cinco da manhã…

O primeiro irmão sou eu, em uma passagem por Porto Alegre para lançar o livro “Boston, a mais longa das maratonas”. O segundo irmão é o professor Filipe, que só tem a primeira beirada da jornada para botar sua corridinha em dia. Correr tão cedo para ele não é uma opção, é o que dá. Na minha rotina maluca, com dias geralmente diferentes uns dos outros, encaixo os treinos combinando vários fatores. Prefiro correr cedo, não excessivamente cedo. Algo como sete da matina é o ideal. Só que, por esses dias, Porto Alegre anda oferecendo algo como sete graus de temperatura no meu horário preferencial. Por isso, realoquei meu treino para o fim da tarde, com o último solzinho do dia aquecendo o corpo, aí já mais próximo dos 16 graus. Melhor.

Melhor, mas fiquei com inveja do meu irmão. Ele saiu, sabe-se lá como, do conforto das cobertas, calçou o tênis e partiu para o trote pelo centro de Porto Alegre cedíssimo. Isso que é treino, pensei eu, sem saber o motivo da admiração. Aí me lembrei de um texto do músico pelotense Vítor Ramil chamado “A estética do frio”. Recomendo, eis aqui (http://www.vitorramil.com.br/textos/Vitor_Ramil_-_A_Estetica_do_Frio.pdf). É sobre um certo fascínio que muitos gaúchos têm pelas “coisas do frio”. Geada, chimarrão, blusas quentes, vinho, há uma beleza nisso tudo. A impressão é que no frio todos ficam mais elegantes. Os gaúchos vibram quando as temperaturas despencam. Disfarçam, “bah, amanhã vai fazer três graus, que horror”. Mas comemoram, se orgulham desse momento europeu do ano.

Desde pequeno me identifico com isso. Até os 20 anos, tinha ido uma única vez a São Paulo e Rio de Janeiro. Mas já tinha dado um jeito de viajar quatro vezes para Buenos Aires. O texto do Vítor Ramil resgata aspectos históricos e aborda, claro, o lado mais artístico do fenômeno. Ele se conectou com uma série de músicos argentinos e uruguaios como Jorge Drexler nesse movimento cultural chamado “A estética do frio”.

Tudo parece fazer o maior sentido. Menos a inveja pelo treino do meu irmão que passou um frio desgraçado.

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O hippie da corrida https://correria.blogfolha.uol.com.br/2018/03/19/o-hippie-da-corrida/ https://correria.blogfolha.uol.com.br/2018/03/19/o-hippie-da-corrida/#respond Mon, 19 Mar 2018 13:28:59 +0000 https://correria.blogfolha.uol.com.br/files/2018/03/IMG_1782-320x213.jpg http://correria.blogfolha.uol.com.br/?p=119 Sou como um hippie trabalhando em uma grande corporação. Enquanto todos capricham nos ternos, gravatas e sapatos lustrados, eu vou de bata. E sandália aberta, escancarando aquela unha estranha. Os cabelos no escritório são bem cortados, bem tratados. Aqui não, é cabelo largado, ressecado pelo sol e pela falta de cuidados. Calma, é só uma metáfora. Não sou assim. Mas é assim que me sinto.

Convivo na tribo dos corredores. Falamos de treinos, corridas, motivação, lesões e… nutrição. Aí começa o meu problema. Sou um desajustado social. Na sociedade da corrida, viro um hippie de multinacional quando o papo envereda para nutrição. “E aí, o que a nutricionista te deu para antes dos treinos?” É nesse instante que eu pigarreio, falo sobre a baixa unidade do ar, finjo atender o vibracall do telefone. Nutre o quê? Não, meu senhor, eu nunca fui a uma nutricionista. Nos check-ups obrigatórios aqui da firma, sou obrigado a “passar” (nunca entendi esse verbo sempre usado entre os profissionais da saúde) pela nutricionista. Geralmente minto quando “passo” por lá. Come agrião? Sempre. Costuma tomar refrigerante? Ah, só de vez em quando. Fruta na sobremesa? Ah, muuuuiiitas vezes. Depois da ficha preenchida, elas descobrem que falta ferro, zinco, cádmio, nióbio ou um desses elementos químicos que eu decorava na tabela periódica da escola. E me prescrevem um cardápio. Que eu guardarei na sexta sessão de meu escritório. Na cesta do lixo.

Mas estou cansado de ser um bastardo nutricional. Queria entrar na linha. Sempre como um pãozinho antes dos treinos, tento repor depois o que perdi, mas nada muito além disso. E com comida de verdade, zero de suplementação, zero de ciência. Sempre achei divertido e maravilhoso poder comer o que der na telha, claro que com a responsabilidade de quem já foi gordinho e sabe como é fácil passar de papa do esporte para pipa. Sempre gostei dessa doce inconsequência de achar que a corrida me libera para a esbórnia nutricional. O tempo passa, e vejo que não é bem assim. Quero tentar entrar na linha. Só não prometo botar fora meu estoque de bananinha Paraibuna que espalhei pelo quarto, escritório, porta-luvas do carro, mochila e outros esconderijos que não conto, não conto, não conto.

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Cérebro trapaceiro https://correria.blogfolha.uol.com.br/2018/02/26/cerebro-trapaceiro/ https://correria.blogfolha.uol.com.br/2018/02/26/cerebro-trapaceiro/#respond Mon, 26 Feb 2018 12:55:39 +0000 https://correria.blogfolha.uol.com.br/files/2018/02/IMG_1772-320x213.jpg http://correria.blogfolha.uol.com.br/?p=103 Se tivesse que levar meia dúzia de palavras para uma ilha deserta, uma delas seria “trapaceiro”. Vá até o espelho do banheiro e repita algumas vezes a expressão “seu trapaceiro, seu trapaceiro”. Perceba musicalidade do vocábulo. O “tra”nasce com a língua entre os dentes, o “pa” requer uma inflada na bochecha, o “cei” se assemelha a uma sibilado de serpente venenosa e o “ro” vem na sequência com um biquinho. A palavra perfeita para fonoaudiólogos corrigirem erros de seus pacientes.

Adoro também as possibilidades semânticas de trapaceiro. É uma espécie de leite condensado, entra nas receitas mais variadas. Cabe muito bem para aquele cafajeste (outra palavra sonora) da concessionária que oferece a metade do valor pelo nosso carro, tratado com tanto carinho nos últimos anos. Fica perfeita para codificar 98% dos habitantes do nosso Congresso, é exata para os nossos pequenos, quando eles nos surram nas partidas de memória (como eles sabem que o segundo quadradinho do palhaço era justamente o primeiro da terceira fileira?).

Como vocês podem perceber, acabei me perdendo em divagações. Ia falar sobre as trapaças do cérebro dos corredores. Um desses truques, tão manjado quanto eficiente, é a “fixação de objetivos múltiplos”. Funciona mais ou menos assim: como se fôssemos uma grande repartição pública, o cérebro envia pedido em duas vias carbonadas para o senhor de blazer xadrez da “central de objetivos”. O documento que ali chega deve ser analisado com rigor pelo burocrata. Se estiver dentro dos conformes, ele usará seu velho carimbo na almofadinha de tinta e golpeará com energia o ofício. O contínuo com a camisa do Corinthians passará por ali, pegará o papel e seguirá para as próximas etapas. Começará pelo andar do pulmão. Ao deixar o documento na mesa do diretor do órgão, verá a reação: dez quilômetros no domingo em 54 minutos? “Verei o que posso fazer.”

O contínuo corintiano esperará a assinatura do pulmão e seguirá a sua peregrinação, indo para o “departamento de pernas”. O encarregado balança a cabeça e diz: “55 minutos, e já está bom demais! Esse pessoal está sempre forçando, não nos dá o voucher da musculação e ainda quer moleza”. Assinará mesmo assim, sacudindo a cabeça em sinal de desaprovação.

A cópia do objetivo desabará também na mesa do responsável pelo aparelho digestivo. Outro reclamão. “Já estou vendo tudo. Na noite do sábado, aquele copinho de cerveja vai virar quatro latinhas. Tomará um café apressado, criará uma azia danada por aqui e ainda quer desempenho? É brincadeira…” Rogará uma praga para o time do contínuo e assinará o papel.

Por fim, e por ironia, a cópia chegará ao próprio cérebro, o arquiteto de tudo. Ele ajustará os óculos de leitura sobre o nariz, colocará os pés sobre a mesa, lerá tudo e assinará o que planejou. É que o cérebro exerce dupla função. Trabalha no setor de planejamento e faz um bico na área de execução. No domingo, por exemplo, fará hora extra e estará administrando a corrida, dosará ritmos, fará com que tudo aconteça como o planejado no papel.

Certo, mas cadê a trapaça nessa história? Bem, aí está a genialidade do cérebro. Já conhecendo os meandros dessa organização e perfeita que é o corpo humano, sabe como tirar o melhor de cada um. Ao invés de traçar um único objetivo, apresenta logo uns três ou quatro. Para corrida de domingo, por exemplo, escreveu assim:
Objetivo mínimo: terminar a prova se caminhar.
Objetivo dois: acabar antes do Palhares do almoxarifado.
Objetivo três: fechar abaixo da marca redonda de 55 minutos.
Objetivo quatro: cravar 54 minutos e bater o recorde pessoal.

Ardiloso, o cérebro sabe como funciona esse povo que só reclama. Se escreve apenas o objetivo real, que é o quarto, o pessoal vê a trabalheira que daria, faz corpo mole e nada feito. Por isso, traça metas intermediárias, já sabendo que no calor da prova todo mundo fica disposto a dar um pouco mais. Outra vantagem dos objetivos múltiplos é saber que eles previnem depressões futuras. É aquela história de quermesse: o primeiro prêmio dá uma bicicleta, o segundo, o rádio-relógio, e bonezinho para todos os dez primeiros. Mesmo perdendo o grande prêmio, o sujeito volta pra casa se sentindo um vencedor com o bonezinho. O cérebro é ou não é um trapaceiro?

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“Forevis Young” https://correria.blogfolha.uol.com.br/2017/12/11/forevis-young/ https://correria.blogfolha.uol.com.br/2017/12/11/forevis-young/#respond Mon, 11 Dec 2017 11:01:47 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg http://correria.blogfolha.uol.com.br/?p=35 Ninguém quer envelhecer, a luta pela eterna juventude é também eterna. As armas é que são constantemente renovadas. Botox, fibras de colágeno, elastina, hidratantes noturnos, cremes, cirurgias plásticas. O arsenal é gigante. E o objetivo é travar o processo mais inevitável que conhecemos. Vamos ficar mais velhos, a musculatura, mais flácida, não tem jeito.

Parecer mais jovem é um valor e tanto hoje em dia. Nada contra quem tenta parecer mais jovem, mas que tal trocar ou acrescentar um novo verbo nessa questão? Que tal mudar a frase, que tal “tentar se sentir mais jovem”? Há uma diferença entre parecer e se sentir. Parecer é para os outros. É a nossa imagem externa. Se sentir é nosso, é pessoal e intransferível. Quem faz atividade física regularmente, quem nada, corre, pedala, sabe do que estou falando. Quem consegue estabelecer uma boa rotina de treinos acaba evoluindo. Em um dia os 5 km de trotes saem penosos, doídos. Meses depois, o sujeito está completando sorrindo uma meia maratona. Que sensação é essa? Não é se sentir mais jovem?

É claro que a opinião dos outros conta. Precisamos de um referendo externo, o elogio geralmente faz bem. Nossa, que pele macia, que cabelo lindo, é tudo positivo. Mas a sensação de bem estar pode ser ainda mais poderosa. E aí não tem química que ajude, não tem um produto externo milagroso. É com a gente mesmo. Um, dois, um, dois… Treino, suor e recompensa. A recompensa pode até ser um elogio, “nossa, que tanquinho”, ou um “puxa, como você está em forma”. Bacana, elogios nunca são demais. Mas acordar e enxergar no espelho um sujeito mais bem disposto vale demais. Mesmo que a imagem do espelho não seja necessariamente de alguém mais jovem, mas simplesmente de alguém melhor.

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É do peru! https://correria.blogfolha.uol.com.br/2017/12/07/e-do-peru/ https://correria.blogfolha.uol.com.br/2017/12/07/e-do-peru/#respond Thu, 07 Dec 2017 12:59:08 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg http://correria.blogfolha.uol.com.br/?p=32 De bobas, as marcas não têm nada. Usam, abusam, apelam da emoção de fim de ano. Forçam a barra em busca de lágrimas e, claro, de impulsos consumistas dos fregueses. O jogo é esse, sempre foi assim. Nem por isso precisamos ser ranzinzas e não reconhecer quando a mensagem gera uma emoção verdadeira.

A Sadia mandou bem como você pode conferir em sua campanha desse Natal. E é de bater palmas sempre quando as marcas vendem seu peixe (peru, frango, o que for) e incentivam de alguma forma o esporte. Mais palmas quando o incentivo vai específico pra corrida.

Eles conseguiram. Colocaram num mesmo filme amor pelo esporte, espírito natalino, generosidade, respeito às diferenças, uma criança com Síndrome de Down e, claro, um peruzão lá no final.

Confira o reclame e resista se for capaz.

http://www.meioemensagem.com.br/home/ultimas-noticias/2017/11/29/em-campanha-de-natal-sadia-aborda-gratidao.html

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Se vira nos 30, amigo! https://correria.blogfolha.uol.com.br/2017/12/01/se-vira-nos-30-amigo/ https://correria.blogfolha.uol.com.br/2017/12/01/se-vira-nos-30-amigo/#respond Fri, 01 Dec 2017 14:34:30 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg http://correria.blogfolha.uol.com.br/?p=25 Nunca me dei conta das semelhanças, mas Copa do Mundo é mesmo uma espécie de maratona. Para quem nunca experimentou, a maratona é uma corridinha de 12 quilômetros que tem uns 30 km de aquecimento. Para quem não sabe, nós, os humanos, não fomos feitos para correr mais do que 30 quilômetros. É o nosso limite, um pouco mais, um pouco menos, dependendo da pessoa.

Qualquer um, até o cunhado que não sai do sofá, pode correr até uns 30 quilômetros se treinar adequadamente. Para depois dos 30, é preciso mais. Alguma aptidão específica, treinamento sério e, principalmente, muita cabeça. É o cérebro implorando para parar com essa bobagem. É o cérebro lembrando a cada músculo que humanos não foram feitos para correr mais do que 30 quilômetros. Dá pra completar a maratona, muitos completam todos os anos e em todas as partes do planeta. Só que é difícil pacas.

A Copa do mundo é assim. Difícil pacas. Só uns poucos a vencem. Não basta ser bom e querer. É necessário ter cabeça, vencer o nervosismo. No futebol, a expressão “cabeça” está relacionada à tradição do país, à “camisa”. Tanto que apenas oito países levantaram a taça desde 1930.

Nesta sexta-feira, primeiro de dezembro, temos sorteio do Mundial da Rússia para definir os grupos da primeira fase. Muita gente dá uma enorme importância a essa primeira fase quando as 32 seleções são distribuídas em oito grupos. Bobagem. A primeira fase equivale aos primeiros 30 quilômetros da maratona. Assim como o longo processo das Eliminatórias representa toda a fase de treinos do maratonista.

Se a maratona não passa de uma corridinha de 12 quilômetros, a Copa do Mundo de verdade também pode ser resumida a partir das oitavas de final quando os confrontos de mata-mata definem quem segue adiante. Ali sim, o jogo começa. Não basta ser bom e estar bem treinado. É necessário “ter cabeça”, estar focado, querer demais.

Quem exagera o ritmo nos 30 quilômetros iniciais corre o risco de não ter fôlego e cabeça para os 12 finais. As seleções que se empolgam demais e se embriagam com o sucesso na primeira fase podem não ter energia para encarar os confrontos a partir das oitavas. O paradoxo disso é que não se pode também relaxar demais nos 30 quilômetros iniciais assim como não se pode bobear na fase de grupos da Copa. Só ganha a medalha da maratona quem sobrevive aos 30. Na Copa, para chegar aos mata-matas, é preciso se virar nos 30 da primeira fase. Mas o jogo só começa depois…

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Mezzo corrida, mezzo diversão https://correria.blogfolha.uol.com.br/2017/11/27/mezzo-corrida-mezzo-diversao/ https://correria.blogfolha.uol.com.br/2017/11/27/mezzo-corrida-mezzo-diversao/#respond Mon, 27 Nov 2017 18:15:24 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg http://correria.blogfolha.uol.com.br/?p=21 A maratona não permite grandes hesitações. Ou se respeita a vecchia signora ou ela nos devora. Não dá pra relaxar na preparação da maratona. Treinos, volumes, sono, hidratação, tudo precisa estar nos trinques. Do contrário, não vai ser legal. Vai faltar energia no final, vamos nos arrastar.

A meia maratona não. Está, como o nome sugere, no meio do caminho. Dá para relaxar um pouco, quem já guarda no cérebro alguma memória esportiva pode treinar menos, prestar menos atenção aos detalhes. E ainda assim conseguir uma performance razoável. Claro, alcançar o recorde pessoal exige mais dedicação. Mas treinando mais ou menos dá mesmo pra fazer uma meia bem razoável.

Aconteceu comigo esses tempos numa meia do Rio. Comecei o ciclo de treinos pensando em performance, queria um recorde. Só que o fim de semana prometia. Muitos encontros com amigos, o Rio sempre implora um chopinho, descontração. Fosse uma maratona, manteria a linha, sem pestanejar. Mas era meia, meia responsa, meia culpa. Mezzo performance, mezzo calabresa.

Na véspera da prova, um glorioso jantar com amigos regado a ótimo vinho. O recorde se foi na terceira taça. Na hora de escolher entre a glória esportiva e a camaradagem, nem foi tão dificil fazer a opção. O anjinho da corrida perdeu para o diabinho social. Cá para nós, tudo tem hora, nem sempre precisamos fingir que somos atletas dedicados. Dar um tempo nessa busca maluca pelos tempos, de vez em quando, é tudo o que precisamos. Ou não?

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